terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Língua literária e a correção idiomática

Considerar a língua literária como modelo de correção idiomática é algo polêmico nos debates atuais sobre linguagem. Em nosso país onde a maioria dos alunos do ensino fundamental e médio  apresentam deficiência de compreensão leitora, ficaria extremamente difícil prescrever um modelo de linguagem exemplar com base na língua literária, já que o contingente de leitores é ínfimo, e a compreensão do que se lê apresenta resultados pífios. Apesar disso, não abraço o radicalismo que não vê nos dias de hoje nenhuma possibilidade de a língua literária abalizar um modelo de língua exemplar que sirva de paradigma ao usuário do português do século XXI. Ao falar em língua literária, convém distinguir uma mais clássica, tal como a que se afigura em Camões, Camilo Castelo Branco, Machado de Assis etc; e outra contemporânea, perceptível por exemplo,em Clarice Lispector. Qual delas serveria bem às pretensões? 

   O professor Evanildo Bechara, filólogo e conceituado gramático, escreveu um texto intitulado  "A Norma Culta em Face da Democratização do Ensino" assim se expressa sobre a significativa contribuição da língua literária: "Algumas vezes, o escritor, pelo prestígio de sua cultura e difusão de sua obra ,passa a ser uma referência de modelo, quase sempre sem que isso  tenha alguma interferência ou consciência.Camões, por exemplo, não pretendeu com os Lusíadas servir de diapasão para os escritores de seu tempo e do seu século, e dos séculos seguintes mais próximos a ele. Mas a verdade é que a linguagem camoniana contribuiu para uniformizar muitas formas duplas, correntes ao seu tempo,dentre as quais o épico fez as suas escolhas,quase sempre certeiras.Assim é que, em vez de antre,o sufixo airo de contrário e a palavra piedade, Camões fixou definitivamente para a língua literária, a preposição entre,a forma contrário e a palavra piedade".
  
In: Miscelânia -80 anos de Adriano da Gama Kury. Ivette Savelli & Laura do Carmo. Rio de Janeiro: Edições Casa de Rui Barbosa, 2005, p. 89. 

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