segunda-feira, 2 de novembro de 2020

 "NEGOCIADORES DE BENÇÃOS"

É indiscutível o fato de a religião está repleta de intermediadores  que negociam os favores de Deus com os homens.

domingo, 19 de julho de 2015

Antes de Colombo, outros chegaram à Ámerica?

 
Quando pequeno, e naturalmente, não apenas eu-, ouvi do professor de História na escola, que Cristovão Colombo descobriu a América em 1492. Tal informação cristalizou-se. Toda criança no continente americano já ouviu isso. Hoje já não é mais assim.
 
Ao que ainda chamamos hipóteses, acrescente-se um registro inserido na literatura chinesa que problematiza ainda mais a questão. Antes lembremos que a China não costuma ser associada com frequência à exploração do Novo Mundo.
 
Shan-hai-Ching - O clássico das Montanhas Orientais é um livro chinês que reproduz um estudo sobre diversas montanhas. Está aceite que os altos picos figuram há muito tempo nas tradições orientais da magia e funcionam como 'repositorium' de energia da terra. Seja como for, o instigante é que as montanhas descritas no livro estariam situadas 'além do mar oriental'. Teriam os chineses estado na América antes de Colombo? Parece que isso tem mexido com os historiadores.
 
Shan-hai-Ching, venerável e polêmico livro, embora seja uma produção secular, datá-lo com exatidão é algo difícil. Durante muitos séculos, sua autoria tem sido atribuída ao imperador Yu, figura semimitológica que teria ascendido ao trono chinês em 2208.
 
Desde então o livro teve inúmeras edições. E isso nem sempre foi bom. Os (i)responsáveis por tal tarefa, foram descuidados. O exemplar teve seu conteúdo reduzido drasticamente e, por muitos anos o livro foi considerado meramente como um compêndio de folclore e crendices. Hoje, o livro desfruta de prestigiosa acolhida no âmbito da historiografia literária chinesa.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Debret - cronista do Brasil

Nestes  tempos, quando o Rio de Janeiro comemora 450 anos de fundação, um nome indubitavelmente merece ser lembrado e reverenciado por seu trabalho artístico. Esse nome é francês, mais parece tão nosso: Jean Baptist Debret (1768-1848). Chegou este francês ao Brasil, em particular à Guanabara, em 26 de março de 1816, e permaneceu nos  trópicos até 1831, quinze anos portanto; tempo que possibilitou ao artista montar seu painel de imagens do Rio, com destaque para nossas paisagens, usos, costumes, história e tradições, além de imagens de nossa negritude e escravidão - desdouro imputado ao Brasil por longos anos, e que ainda hoje, permanece sob o disfarce de outras formas de escravidão, maximé  pela ideologia e postura política equivocadamente rotulada de 'democracia'.
À parte destas ilações, voltemos a Debret. Seu acervo iconográfico, felizmente preservado e divulgado  nos centros culturais europeus num primeiro momento, despertou copioso interesse. Outros artistas vieram, e a contribuição desses igualmente valiosa ajudou a pontilhar a história do Brasil, em especial, de nossa cidade o Rio de Janeiro.
Sua produção artístico-literária, 'Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil', 1º volume, foi inicialmente publicado em Paris (1834). No ano seguinte, publicou-se a segunda parte da obra, e em 1839 o terceiro e último tomo. E nada melhor que o próprio autor falar de sua obra, leiamos, por exemplo sua Introdução, constante da terceira parte a que me referi acima.
"Depois de ter escrito, em meu primeiro volume, o estado selvagem do povo brasileiro, assunto do qual o invariável caráter primitivo já foi tratado com irrepreensível exatidão, por sábios viajantes europeus, reuni, na segunda parte da mesma obra, os detalhes mais raros e quase ignorados da história da indústria desse povo civilizado, submetido ao jugo português, indústria que, em seu começo, limitada a satisfazer às primeiras necessidades da vida, não diferia do estado selvagem senão pelas  fórmulas impostas na troca comercial dos produtos indígenas contra instrumentos agrícolas e alguns panos grosseiramente fabricados pela Inglaterra e importados por Portugal, mas que, mais tarde, devia oferecer  um possante interesse no seu desenvolvimento, apressado pela ativa influência dos estrangeiros. [...] Enfim, a terceira parte de que me ocupo, a história política e religiosa, importante por sua especialidade, submetida ela própria ao reflexo das combinações diplomáticas da Europa, constantemente agitada desde 1789, prepara um quadro interessante, rico de episódios recolhidos nos locais e cujo encadeamento servirá para  restabelecer para sempre os traços já está apagados  dos primeiros passos para a civilização deste povo recentemente regenerado". 
Objetivando dar uma feição didática à Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, publicou-se "Debret' - Todas as ilustrações devidamente explicadas sobre a obra, apresentação e texto por Herculano Gomes Mathias, volume em formato de bolso - editora Tecnoprint (Coleção Prestígio nº 673), exemplar que disponho, editada em 1947, e que sugiro como leitura complementar.
Saudamos e aplaudimos Debret, intérprete pioneiro da história brasileira, em especial de nossa amada cidade. O Rio é Debret, Debret é o Rio.

sábado, 26 de abril de 2014

Pugilato verbal na Idade Média: cristãos x judeus

A rixa entre cristãos e judeus não remonta apenas ao período neo-testamentário. Em diferentes momentos na Idade Média-, o embate entre porta-vozes do Cristianismo e do Judaísmo agregou uma constelação de teólogos cristãos, entre os quais, o erudito Jerônimo e sábios judeus, especialmente rabinos, saindo-se muito bem nessas conturbadas querelas, por exemplo, R. Yehiel de Paris, que convocado por um dos Papas da época- foi inquirido  sobre as crenças que fundamentavam o Judaísmo. Participavam desses debates não apenas oponentes religiosos, mas rainhas, cardeais etc.
Por conta das dificuldades de tradução desses documentos para o português, o publico ledor desses registros limitou-se a brasileiros com conhecimentos de latim, francês alemão  e é claro, da língua inglesa.
A divulgação desses documentos em português, deve-se em parte ao significativo contributo prestado pela  editora Imago que na década de 90 publicou 'O judaísmo em julgamento'- Os debates judaico-cristãos na Idade Média, obra organizada por Hyam Maccoby. Desse compêndio, selecionei um trecho que reproduz a atmosfera desses debates. Leiamos.

A Vikuah de R. Yehiel de Paris:
Uma paráfrase
De Vikuah Rabenu Yehiel mi-Paris,
Grübaum, 1873.( ano de publicação)

No excerto que ora passo a transcrever, Donin, inquiridor autorizado pelo Papa (o documento não cita o nome do pontífice) -  faz a seguinte colocação a Yehiel:

Donin: O Talmude contém blasfêmias contra Jesus. Por exemplo, o Talmude diz que Jesus está no inferno e sua punição é ficar imerso em excremento fervente [b.Git, 56b]. (Voltando para a rainha e falando em francês.) Isto é para mostrar que nós cristãos, fedemos.

Yehiel: Nos últimos quinze anos, desde que vos afastastes de nós, tendes procurado armar ciladas, porém não haveis de ter êxito. Este  Jesus, mencionado aqui no Talmude, é outro Jesus e não aquele que os cristãos adoram. Este foi um certo Jesus que zombou das palavras dos Sábios e acreditava apenas no que está nas Escrituras, como vós. E é possível afirmar isso, pois ele não é chamado "Jesus de Nazaré, mas somente 'Jesus'. [...] 

O fragmento acima, e um pouco mais do que está facultado ao conhecimento de leitores e/ou pesquisadores - integra a obra que já referenciei anteriormente. Note-se, que no exemplo em destaque- uma rainha é citada e, em outros trechos da obra são feitas alusões a reis. Este pugilato verbal durou séculos, mas será que acabou? 
                                                       
                                                                 MACCOBY, Hyam. (org.) . O Judaísmo em Julgamento. Os    
                                                                 debates judaico-cristãos na Idade Média.Imago: Rio de Janeiro,
                                                                 1996.

                

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Língua literária e a correção idiomática

Considerar a língua literária como modelo de correção idiomática é algo polêmico nos debates atuais sobre linguagem. Em nosso país onde a maioria dos alunos do ensino fundamental e médio  apresentam deficiência de compreensão leitora, ficaria extremamente difícil prescrever um modelo de linguagem exemplar com base na língua literária, já que o contingente de leitores é ínfimo, e a compreensão do que se lê apresenta resultados pífios. Apesar disso, não abraço o radicalismo que não vê nos dias de hoje nenhuma possibilidade de a língua literária abalizar um modelo de língua exemplar que sirva de paradigma ao usuário do português do século XXI. Ao falar em língua literária, convém distinguir uma mais clássica, tal como a que se afigura em Camões, Camilo Castelo Branco, Machado de Assis etc; e outra contemporânea, perceptível por exemplo,em Clarice Lispector. Qual delas serveria bem às pretensões? 

   O professor Evanildo Bechara, filólogo e conceituado gramático, escreveu um texto intitulado  "A Norma Culta em Face da Democratização do Ensino" assim se expressa sobre a significativa contribuição da língua literária: "Algumas vezes, o escritor, pelo prestígio de sua cultura e difusão de sua obra ,passa a ser uma referência de modelo, quase sempre sem que isso  tenha alguma interferência ou consciência.Camões, por exemplo, não pretendeu com os Lusíadas servir de diapasão para os escritores de seu tempo e do seu século, e dos séculos seguintes mais próximos a ele. Mas a verdade é que a linguagem camoniana contribuiu para uniformizar muitas formas duplas, correntes ao seu tempo,dentre as quais o épico fez as suas escolhas,quase sempre certeiras.Assim é que, em vez de antre,o sufixo airo de contrário e a palavra piedade, Camões fixou definitivamente para a língua literária, a preposição entre,a forma contrário e a palavra piedade".
  
In: Miscelânia -80 anos de Adriano da Gama Kury. Ivette Savelli & Laura do Carmo. Rio de Janeiro: Edições Casa de Rui Barbosa, 2005, p. 89. 

Bandeira, amigo do rei

Em outubro do ano em curso, amantes e cultores da poética de Manuel Bandeira, na qual humildemente me incluo, verão completar-se o quadragésimo sexto ano de sua morte. Em 13 de outubro de 1968- O Jornal do Brasil noticiou a morte do poeta.Houve grande comoção entre os que vivenciaram esse momento. A ressonância de sua verve literária, sua poesia vibrátil continuam ainda a nos dizer: Fui-me embora para Pasárgada... Espero recordar-me disso e contar aos meninos e meninas nas aulas de literatura. VOU-ME EMBORA PRA PARSÁGADA Vou-me embora pra Parságada Lá sou amigo do rei Lá tenho a mulher que eu quero Na cama que escolherei Vou-me embora pra Parságada Vou-me embora pra Parságada Aqui eu não sou feliz Lá a existência é uma aventura De tal modo inconsequente Que Joana a louca de Espanha Rainha e falsa demente Vem a ser contraparente Da nora que nunca tive ...............................................

segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

Apócrifos: o livro de Enoque

Em minha formação protestante, principalmente nos estudos de teologia, sempre fui ensinado a considerar os apócrifos como livros "quase malditos"-, em que pese não integrarem o cânon bíblico.Cito como exemplo, o livro de Enoque. Como professor de literatura, não posso desprezá-los, até porque possuem importância histórica e constituem de certo modo um acervo literário-religioso produzido a milhares de anos(evito aqui demarcar sua cronologia)e ainda mais: estimulo que povo evangélico e os teólogos igualmente construam um conceito mais racional acerca desses livros, evitando vê-los como sem importância já que não se configuram no corpus bíblico. Voltando ao livro de Enoque, muito embora não pretenda discutir legitimidade autoral, circunstância em que foi escrito, manuscritos e a confiabilidade de posteriores traduções por copistas, a proibição de sua leitura, sua ampla aceitação entre os esotéricos - dois aspectos inviabilizam sua aceitação entre católicos e protestantes: a ideia de oculto, reforçando o misticismo; a condição permanente de suspeição, que gera a concepção de livro pouco confiável. O livro de Enoque, embora preterido do status de canônico, tem o nome seu "autor" citado na na Bíblia, confira: a) Segundo o livro de Gênesis, teve por pai Jarede, Gn5:18; b) Aos sessenta e cinco anos gerou a Matusalém, Gn5:21; c) "Andou Enoque com Deus, depois que gerou a Matusalém, trezentos anos; e gerou filhos e filhas", Gn5:22; d) "Enoque andou com Deus, e não apareceu mais, porquanto Deus o tomou", Gn5:24. Isto o grande mistério em torno de sua pessoa. Ainda no Novo Testamento, no livro de Hebreus, capítulo 11:5, lemos: "Pela fé Enoque foi transladado para não ver a morte; e não foi achado, porque Deus o transladara; pois antes da sua transladação alcançou testemunho de que agradara a Deus". Por transladado, entenda-se "arrebatado", ou seja, Deus o arrebatou, o tomou para si. Como? Este é o mistério. O curioso é que incrédulos desacreditam a bíblia, mas validam o Livro de Enoque;e os crédulos? Ah! Estes condenam veementemente o livro de Enoque, mas validam piamente a referência ao seu nome citado nas Escrituras.`É o velho dilema das crenças em conflito. Ponderando: que o livro de Enoque e outros apócrifos não sejam vistos como demoníacos, e muito menos a Bíblia não deixe de ser reputada como não inspirada por Deus. Finalizando, não posso prescindir de indicar uma referência bibliográfica.(sem medo de consultar, mas como diz a bíblia "examinando tudo". O livro de Enoch, editora Hemus (1982),212 p.(Esta é a minha edição) Há edições mais recentes.